Do padre Orivaldo Robles:
Foram diferentes entre si. Um, transparente a todas as mídias. Outro, ignorado até pelos vizinhos. Os dois, agora louvados em público, nas páginas dos maiores jornais do país. Não por católicos piedosos, mas por “adversários”. Pelo ateu Jabor. Pelo agnóstico Cony.
Jabor achava o papa mais inútil que barão do Império. Após sua morte, admitiu: “Devo confessar que nunca gostei desse papa (…). Ontem, vendo os milhões chorando pelo mundo, vendo a praça cheia, entendi de repente sua obra, sua imensa importância (…). Emocionado, senti minha intensíssima solidão de ateu (…). Sou ateu, sozinho, condenado a não ter fé, mas vi que, se há alguma coisa de que precisamos hoje, é de uma nova ética, de um pensamento transcendental, de uma espiritualidade perdida. João Paulo na verdade deu um show de bola”.
Dom Eugênio foi alvo de apreciações ácidas; muitas, injustas. Discreto, jamais respondeu. Agora, não tem como se defender. Creio no depoimento de quem dele recebeu proteção na ditadura militar. Cony penou nos calabouços do regime e por ele foi socorrido. Não se constrange em declarar: “Se fosse muçulmano, umbandista, técnico de futebol, comunista ou lixeiro, dom Eugênio Sales seria o que sempre foi: um homem reto, sincero, fiel a seus princípios e, sobretudo, humano. Acontece que foi sacerdote, bispo e cardeal. Sua trajetória tinha um ponto de referência lá em cima – no caso dele, o Deus no qual acreditava e a Igreja à qual servia em tempo integral e em modo total. (…) Conservador, sim, e mais do que isso: coerente e sincero com sua forma de pensar e agir no mundo. O pessoal de certa esquerda o criticava porque não bajulava causas e doutrinas que entravam em moda. Ele fizera sua opção básica por uma religião estruturada, multissecular (…). Protegeu perseguidos políticos daqui e de fora, com uma firmeza que desarmava os militares. Eu próprio, em certa época, fui rastreado por ele e por dois de seus auxiliares, dom Eduardo e dom Rafael. Em alguns momentos de perigo que atravessei, ia dormir na casa de dom Eugênio (…)”.
Jabor e Cony revelam uma carência de que hoje padecemos. De homens que, mesmo em suas fraquezas, sejam marcos a nos apontar o Infinito. Que não se ajustem ao cambiante gosto da maioria. Nem fujam das críticas para surfar na ágil onda do sucesso. Que deixem claro de que lado estão.