Que prevaleça nossa vocação democrática

Prefaciado e coordenado pelo Cardeal Arcebispo de São Paulo, D. Paulo Evaristo Arns, o livro Brasil: Nunca Mais retrata a ditadura militar, bem como a fila imensa dos prisioneiros políticos, dos torturados, dos assassinados ou simplesmente desaparecidos desde 1964, realidade negada pelo atual capitão- presidente.

A verdade é que, principalmente nos anos de chumbo, ser listado para o cárcere, para a tortura, para o assassinato ostensivo ou para o desaparecimento, era operação de rotina. No Paraná, a família do estudante de Apucarana, no interior do Estado, vive até hoje a dúvida duradoura quanto ao desaparecimento do filho e irmão, José dos Três Reis de Oliveira.

Durante a Assembleia Nacional Constituinte, recebemos a visita de Maria Eunice Paiva e filhos, insistindo em querer informações a respeito do paradeiro do marido e pai, ex-deputado federal Rubens Paiva, que foi aprisionado em casa por seis pessoas armadas, sob a acusação de que mantinha correspondência com brasileiros exilados no Chile. Tudo começava com as investigações da Dops ( Delegacia de Ordem Política e Social), fortemente instruída por espiões do SNI (Serviço Nacional de Informações).

A propósito, em recente viagem a Curitiba, em visita ao ex-deputado Nilso Sguarezzi, fui surpreendido com esta pergunta: “E você sabia, Tadeu França, que você também foi lembrado pela Dops/Paraná?”. Surpreso ante o inusitado da pergunta, lembrei- me das ameaças anônimas via telefone por ocasião das greves do magistério paranaense. Entretanto, não me imaginava como alvo de interesse pelos investigadores da Dops.

Mas não havia por que duvidar. Era segura a fonte de informação:
Nome do indiciado provável: José Tadeu Bento França;
Enquadramento: Lei de Segurança Nacional;
Crime: subversão por discursos inflamados contra as autoridades militares do país.
Comunista. Sim ou não?
INCONCLUSA a investigação.

No atual momento, é preciso que todas as pessoas de bom senso cooperem ante os cotidianos excessos de nosso dia-a-dia. Não nos devem interessar as ditaduras, sejam elas da extrema direita ou da extrema esquerda. Que prevaleça a nossa vocação democrática.

Ante o clamor de certos seguidores do capitão-presidente, aos gritos de Intervenção Militar e AI 5 Já, que leiam Brasil: Nunca Mais, obra que continua atual. Acima de tudo, que paire em nossas mentes a indagação de Alceu Amoroso Lima em plena vigência da ditadura militar, mas válida para hoje ante as insinuações de atentados à democracia: “Até quando haverá no Brasil mulheres que não sabem se são viúvas; filhos que não sabem se são órfãos; criaturas humanas que batem em vão em portas implacavelmente trancadas de um Brasil que julgávamos ingenuamente isento de tais insanas crueldades?”.


(*) Tadeu Bento França, ex-deputado federal constituinte